Disciplina: Língua Portuguesa 0 Curtidas
Vanda vinha do interior de Minas Gerais e de dentro de um - ENEM 2022
Atualizado em 13/05/2024
Vanda vinha do interior de Minas Gerais e de dentro de um livro de Charles Dickens. Sem dinheiro para criá-la, sua mãe a dera, com seus sete anos, a uma conhecida. Ao recebê-la, a mulher perguntou o que a garotinha gostava de comer. Anotou tudo num papel. Mal a mãe virou as costas, no entanto, a fulana amassou a lista e, como uma vilã de folhetim, decretou: “A partir de hoje, você não vai mais nem sentir o cheiro dessas comidas!”. Vanda vinha do interior de Minas Gerais e de dentro de um livro de Charles Dickens. Sem dinheiro para criá-la, sua mãe a dera, com seus sete anos, a uma conhecida. Ao recebê-la, a mulher perguntou o que a garotinha gostava de comer. Anotou tudo num papel. Mal a mãe virou as costas, no entanto, a fulana amassou a lista e, como uma vilã de folhetim, decretou: “A partir de hoje, você não vai mais nem sentir o cheiro dessas comidas!”.
Vanda trabalhou lá até os quinze anos, quando recebeu a carta de uma prima com uma nota de cem cruzeiros, saiu de casa com a roupa do corpo e fugiu num ônibus para São Paulo.
Todas as vezes que eu e minha irmã a importunávamos com nossas demandas de criança mimada, ela nos contava histórias da infância de gata-borralheira, fazia-nos apertar seu nariz quebrado por uma das filhas da “patroa” com um rolo de amassar pão e nos expulsava da cozinha: “Sai pra lá, peste, e me deixa acabar essa janta”.
PRATA, A. Nu de botas. São Paulo: Cia. das Letras, 2013 (adaptado).
Pela ótica do narrador, a trajetória da empregada de sua casa assume um efeito expressivo decorrente
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citação a referências literárias tradicionais.
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alusão à inocência das crianças da época.
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estratégia de questionar a bondade humana.
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descrição detalhada das pessoas do interior.
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representação anedótica de atos de violência.
Solução
Alternativa Correta: E) representação anedótica de atos de violência.
O examinador considerou que nesse relato trágico sobre a vida da menina abandonada, Vanda, há uma representação anedótica. Os dicionários Houaiss, Porto, Aurélio dão o sentido de anedota como narrativa breve, de um fato engraçado ou picante. Essa acepção inexiste nesse texto. Anedota no sentido que o examinador considerou (“breve relato histórico ou fato curioso, geralmente rela cionado com a vida de personagem célebre ou lendário”) consta apenas no Michaeles e também em autores do século XIX, como Machado de Assis, autor do conto Anedota Pecuniária. Frise-se que a personagem Vanda não se liga a fato histórico, nem a curioso, é uma me nina, como infeliz - mente muitas, que é abandonada e maltratada.
Embora a alternativa e seja a resposta desse teste não se pode desconsiderar a alternativa a, que é mais pertinente, pois, no texto, há “a citação a referência literárias tradicionais”. A primeira delas é o fato de a pobre Vanda vir “dentro de um livro de Charles Dickens”, autor inglês do século XIX, que denunciou os maus tratos à infância no período da Segunda Revolução Industrial. A mulher que recebeu Vanda da mãe agiu como “vilã de folhetim”, isto é, personagem típica das narrativas publicadas em jornal no século XIX. No decorrer do texto, Vanda vai contar “histórias da infância de gata borralheira”, narrativa proveniente de lendas populares, coletada por Charles Perrault no século XVII.
O gabarito oficial desconsiderou a intertextualidade recorrente no texto, remetendo o sentido de anedota a uma acepção inexistente nos dicionários já citados.
Resolução adaptada de: Curso Objetivo
Área do Conhecimento: Linguagens Códigos e suas tecnologias
Ano da Prova: 2022
Nível de Dificuldade da Questão: Difícil
Assuntos: Gêneros Textuais, Textos Literários
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