Disciplina: Língua Portuguesa 0 Curtidas

Quando dialoga com sua possível leitora, o narrador - UNIFESP 2012

Atualizado em 29/11/2024

Para responder a questão, leia o trecho do conto de Machado de Assis.

Flor Anônima

Manhã clara. A alma de Martinha é que acordou escura.
Tinha ido na véspera a um casamento; e, ao tornar para casa, com a tia que mora com ela, não podia encobrir a tristeza que lhe dera a alegria dos outros e particularmente dos noivos.
Martinha ia nos seus... Nascera há muitos anos. Toda a gente que estava em casa, quando ela nasceu, anunciou que seria a felicidade da família. O pai não cabia em si de contente.
– Há de ser linda!
– Há de ser boa!
– Há de ser condessa!
– Há de ser rainha!
Essas e outras profecias iam ocorrendo aos parentes e amigos da casa.
Lá vão... Aqui pega a alma escura de Martinha. Lá vão quarenta e três anos — ou quarenta e cinco, segundo a tia; Martinha, porém, afirma que são quarenta e três. Adotemos este número. Para ti, moça de vinte anos, a diferença é nada; mas deixa-te ir aos quarenta, nas mesmas circunstâncias que ela, e verás se não te cerceias uns dois anos. E depois nada obsta que marches um pouco para trás. Quarenta e três, quarenta e dois, fazem tão pouca diferença...
Naturalmente a leitora espera que o marido de Martinha apareça, depois de ter lido os jornais ou enxugado do banho. Mas é que não há marido, nem nada. Martinha é solteira, e daí vem a alma escura desta bela manhã clara e fresca, posterior à noite de bodas.
Só, tão só, provavelmente só até a morte; e Martinha morrerá tarde, porque é robusta como um trabalhador e sã como um pero. Não teve mais que a tia velha. Pai e mãe morreram, e cedo.
A culpa dessa solidão a quem pertence? Ao destino ou a ela? Martinha crê, às vezes, que ao destino; às vezes, acusase a si própria. Nós podemos descobrir a verdade, indo com ela abrir a gaveta, a caixa, e na caixa a bolsa de veludo verde e velha, em que estão guardadas todas as suas lembranças amorosas. Agora que assistira ao casamento da outra, teve ideia de inventariar o passado. Contudo hesitou:
– Não, para que ver isto? É pior: deixemos recordações aborrecidas.

(www.dominiopublico.gov.br. Adaptado.)

Quando dialoga com sua possível leitora, o narrador enfatiza que

  1. a juventude deve ser aproveitada intensamente, para que as mulheres, na velhice, não sofram com os danos do tempo.

  2. a idade, ainda que passe para todas as mulheres incondicionalmente, preocupa-as mais na sua juventude.

  3. as moças dão pouca atenção à idade, já que sabem da impossibilidade de fazer com que o tempo pare e as mantenha jovens.

  4. alguns anos passam despercebidos na juventude, mas são muito representativos mais tarde, na vida, se não houve casamento.

  5. umas pessoas sofrem mais que outras quando passa a juventude, notadamente se têm mais lembranças amorosas.


Solução

Alternativa Correta: D) alguns anos passam despercebidos na juventude, mas são muito representativos mais tarde, na vida, se não houve casamento.

A alternativa D, "alguns anos passam despercebidos na juventude, mas são muito representativos mais tarde, na vida, se não houve casamento", é a resposta correta porque reflete diretamente a reflexão do narrador sobre o passar do tempo e a importância do casamento para Martinha. O narrador faz uma observação à leitora jovem, destacando que a diferença entre os anos de vida pode parecer irrelevante na juventude, mas, ao envelhecer, especialmente para mulheres solteiras, esses anos ganham um peso significativo. A frase "deixa-te ir aos quarenta, nas mesmas circunstâncias que ela [sem se casar], e verás se não te cerceias uns dois anos" evidencia essa ideia de que o tempo se torna mais crítico com a idade, especialmente para quem não se casou.

O texto destaca que, enquanto na juventude a idade parece algo distante e sem grande impacto, à medida que se envelhece, a falta de casamento e a solidão tornam-se questões centrais, que ganham mais peso na reflexão de quem ainda não se casou, como é o caso de Martinha. A sua solidão, ao acordar com a "alma escura", reflete o arrependimento ou a percepção de que o tempo, que antes parecia irrelevante, agora pesa, pois ela nunca se casou e está cada vez mais distante dessa possibilidade.

As outras alternativas não capturam a essência do que é enfatizado pelo narrador. A alternativa A fala sobre aproveitar a juventude, mas o foco do texto é mais sobre como a juventude pode ser percebida de forma diferente com o passar dos anos, especialmente em relação à falta de casamento. A alternativa B discute a preocupação com a idade, mas a ênfase do narrador é a diferença entre como a idade é vista na juventude e como ela se torna crítica com a maturidade. A alternativa C trata da percepção da juventude em relação à idade, mas o cerne do texto é o impacto da falta de casamento ao longo dos anos. Já a alternativa E fala sobre lembranças amorosas, mas não é isso que define a reflexão do narrador sobre o tempo e o casamento. Portanto, a alternativa D é a mais precisa.

Institução: UNIFESP

Ano da Prova: 2012

Assuntos: Interpretação Textual

Vídeo Sugerido: YouTube

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