Disciplina: Língua Portuguesa 0 Curtidas
Ainda no texto 1, terceiro parágrafo, as vírgulas que - PUC/SP 2019
Texto I
O humor e a liberdade de expressão
A atividade humorística tem limites? Essa questão voltou à tona com a recente informação de que Danilo Gentili foi condenado à pena de seis meses e vinte e oito dias de prisão, em regime semiaberto, em razão de ofensas direcionadas à deputada Maria do Rosário (PT/RS). Ele pode recorrer da sentença proferida. Nova mente o choque entre liberdade de expressão e direito à honra se coloca no centro de uma discussão que está longe de acabar, pois versa sobre direitos previstos na Constituição da República e que às vezes são inconciliáveis.
O humor é importante para a sociedade, pois, além da sensação de bem-estar que causa, tem uma função de apontar falhas e incoerências dos seres humanos. É rindo que se corrigem os costumes. Não raramente é pelo humor que críticas veementes conseguem ser feitas.
Quem podia fazer gracejos e indicar defeitos do Rei? O bobo da corte. Assim, já vem há séculos essa característica de crítica social feita pelo humorista que, de forma aparentemente despretensiosa, toca em assuntos difíceis e diz verdades, se aproveitando da roupagem amena e agradável que confere às suas palavras.
Quem não conhece o filme O Grande Ditador, de Charlie Chaplin, que ridicularizou Hitler? Outro filme inesquecível é A Vida é Bela, de Roberto Benigni, que, sob o véu da comédia mostrou o horror do holocausto e o esforço feito por um pai para que o filho não entendesse o que se passava e, por isso, sofresse menos no campo de concentração.
É, porém, árdua a tarefa de identificar se o humorista agiu de forma adequada ou ultrapassou a barreira do aceitável, que é uma tênue linha entre a arte e a ofensa, ou seja, o legal e o ilegal.
Não existe um direito absoluto e que sempre se sobreponha aos demais, bastando observar que a Constituição brasileira prevê a possibilidade de aplicação da pena de morte no caso de guerra declarada, situação de tamanho perigo para o país que até o direito à vida é limitado. Assim, demais direitos como a liberdade de expressão e de crítica também sofrem atenuações, não podendo servir de respaldo a comportamentos lesivos.
Voltando ao caso de Danilo Gentili, as informações mostram que ele usou palavra de baixo calão ao se referir a Maria do Rosário e teve conduta ofensiva ao demonstrar seu descontentamento. Se assim agiu para fazer humor ou não, torna-se questão secundária porque a manifestação do pensamento é livre, porém não pode lesar a honra da pessoa a quem ela se dirige.
Marco Antonio dos Anjos Estadão - Portal do Estado de S.Paulo, 18 abril 2019.
Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/faustomacedo/o-humor-e-a-liberdade-de-expressao/. Acesso em: 20 abr. 2019. [Adaptado.]
Texto II
Caso Gentili mostra que não há liberdade sem responsabilidade
A Constituição de 1988 proibiu a censura e instituiu a liberdade de expressão como norma máxima no Brasil. Como consequência disso, prevê-se apenas responsabilização a posteriori das condutas.
A doutrina clássica que fundamenta a liberdade de expressão, reconhecendo um mercado de ideias que se autorregula e que propicia o máximo de liberdade ao maior número de pessoas, já previa a possibilidade — sempre posterior — de avaliar as informações e de regulá-las de acordo com o estado democrático das coisas. “Todo homem pode pôr diante do público o que bem lhe aprazer, mas, se publicar o impróprio, malicioso ou ilegal, terá consequências”, escreveu Blackstone, inglês que contribuiu decisivamente para o reconhecimento da liberdade de expressão.
Entendendo que a honra objetiva (reputação) e a honra subjetiva (o sentido que se tem de si mesmo) são valores determinantes para a boa convivência social, o direito brasileiro protegeu-as mediante a criação das normas penais de difamação e injúria, respectivamente.
A honra é um bem jurídico protegido penalmente pelo Estado democrático brasileiro. E foi precisamente essa a racionalidade utilizada na sentença da juíza federal Maria Isabel do Prado que condenou o apresentador Danilo Gentili às penas definidas para crimes de injúria e difamação em face da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).
A juíza Maria Isabel fundamentou a condenação em atos provados no processo. Em posts de mídia social com amplo acesso no país, Gentili dirigiu-se à vítima em tom de deboche como “puta”, “falsa”, “cínica” e “nojenta” — o que indubitavelmente fere a honra de Maria do Rosário. [...] É evidente a adequação objetiva [dessa conduta] de Danilo Gentili aos tipos descritos nos artigos 140 e 141 do Código Penal. A reputação e a dignidade da vítima foram violadas, e os valores inerentes a essa proteção penal foram flexibilizados.
Ao aplicar a pena ao réu, a sentença reafirma a proteção penal da honra, objetiva e subjetiva, de cada um dos brasileiros.
É um engano pensar que, por se tratar de um humorista, Danilo Gentili estaria imune à lei penal. O animus jocandi da conduta não exclui a possibilidade de ofensa à vítima e, portanto, de violação da norma penal. Também as brincadeiras e o humor devem respeitar as regras do Estado democrático de Direito. Caso contrário, seria atribuir imunidade desigual aos que são mais engraçados.
A sentença falha tecnicamente, no entanto, ao impor o cumprimento da pena de 6 meses e 28 dias de detenção em regime semiaberto.
O Código Penal prevê a substituição da pena de prisão por penas restritivas de direito, as quais se mostram mais adequadas e mais proporcionais ao caso concreto. O Brasil tem muito a avançar no respeito à liberdade. Ainda engatinhamos. E nesse caminho de aprendizado é imprescindível reconhecer que as ações livres — por expressarem a autonomia do agente —, são passíveis de responsabilização.
A Constituição proíbe a censura e assegura um regime de liberdade e de responsabilidade. A Justiça cumpre o seu papel quando aplica essa racionalidade a todos, sem qualquer discriminação.
Marina Coelho Araújo Folha de S.Paulo, 13 abril 2019. Caderno Poder, p. A8 [Adaptado]
Ainda no texto 1, terceiro parágrafo, as vírgulas que intercalam “de forma aparentemente despretensiosa” têm a função de destacar
a) a atenuação ao modo com que acontecem as críticas pelo humor.
b) o poder crítico e pretencioso das palavras humorísticas.
c) a característica do humorista de humanizar o que critica.
d) o objetivo de exacerbar a crítica social pelo humor.
Solução
Alternativa correta: A) a atenuação ao modo com que acontecem as críticas pelo humor. De acordo com o gabarito AVA.
A expressão "de forma aparentemente despretensiosa" de fato age como um adjunto adverbial de modo, indicando como a crítica é feita pelo humorista. No entanto, sua função principal é destacar o modo como o humorista aborda as críticas, dando a entender que elas são feitas de uma maneira que aparenta ser despretensiosa, mesmo que possam ter um impacto significativo.
Assuntos: Adjunto Adverbial, Expressões
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