Disciplina: Língua Portuguesa 0 Curtidas
Quando se quer chamar atenção para o Objeto Direto que - UNIFESP 2015
Leia o texto para responder a questão.
Cumpridos dez anos de prisão por um crime que não pratiquei e do qual, entanto, nunca me defendi, morto para a vida e para os sonhos: nada podendo já esperar e coisa alguma desejando – eu venho fazer enfim a minha confissão: isto é, demonstrar a minha inocência.
Talvez não me acreditem. Decerto que não me acreditam. Mas pouco importa. O meu interesse hoje em gritar que não assassinei Ricardo de Loureiro é nulo. Não tenho família; não preciso que me reabilitem. Mesmo quem esteve dez anos preso, nunca se reabilita. A verdade simples é esta.
E àqueles que, lendo o que fica exposto, me perguntarem: “Mas por que não fez a sua confissão quando era tempo? Por que não demonstrou a sua inocência ao tribunal?”, a esses responderei: – A minha defesa era impossível. Ninguém me acreditaria. E fora inútil fazer-me passar por um embusteiro ou por um doido… Demais, devo confessar, após os acontecimentos em que me vira envolvido nessa época, ficara tão despedaçado que a prisão se me afigurava uma coisa sorridente. Era o esquecimento, a tranquilidade, o sono. Era um fim como qualquer outro – um termo para a minha vida devastada. Toda a minha ânsia foi pois de ver o processo terminado e começar cumprindo a minha sentença.
De resto, o meu processo foi rápido. Oh! o caso parecia bem claro… Eu nem negava nem confessava. Mas quem cala consente… E todas as simpatias estavam do meu lado.
O crime era, como devem ter dito os jornais do tempo, um “crime passional”. Cherchez la femme*. Depois, a vítima um poeta – um artista. A mulher romantizara-se desaparecendo. Eu era um herói, no fim de contas. E um herói com seus laivos de mistério, o que mais me aureolava. Por tudo isso, independentemente do belo discurso de defesa, o júri concedeu-me circunstâncias atenuantes. E a minha pena foi curta.
Ah! foi bem curta – sobretudo para mim… Esses dez anos esvoaram-se-me como dez meses. É que, em realidade, as horas não podem mais ter ação sobre aqueles que viveram um instante que focou toda a sua vida. Atingido o sofrimento máximo, nada já nos faz sofrer. Vibradas as sensações máximas, nada já nos fará oscilar. Simplesmente, este momento culminante raras são as criaturas que o vivem. As que o viveram ou são, como eu, os mortos-vivos, ou – apenas – os desencantados que, muita vez, acabam no suicídio.
* Cherchez la femme: Procurem a mulher.
(Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio, 2011.)
Quando se quer chamar atenção para o Objeto Direto que precede o verbo, costuma-se repeti-lo. É o que se chama Objeto Direto Pleonástico, em cuja constituição entra sempre um pronome pessoal átono.
(Celso Cunha e Lindley Cintra.
Nova gramática do português contemporâneo, 2000.)
Verifica-se a ocorrência de objeto direto pleonástico em:
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“As que o viveram ou são, como eu, os mortos-vivos, ou – apenas – os desencantados”
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“Esses dez anos esvoaram-se-me como dez meses.”
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“Por tudo isso, independentemente do belo discurso de defesa, o júri concedeu-me circunstâncias atenuantes.”
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“Simplesmente, este momento culminante raras são as criaturas que o vivem.”
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“Atingido o sofrimento máximo, nada já nos faz sofrer.”
Solução
Alternativa Correta: D) “Simplesmente, este momento culminante raras são as criaturas que o vivem.”
A alternativa D é a correta porque identifica a ocorrência de um objeto direto pleonástico na frase “Simplesmente, este momento culminante raras são as criaturas que o vivem.” Nesse contexto, "este momento culminante" é o objeto direto do verbo "viver", que é mencionado através da oração subordinada "que o vivem". O pronome "o" refere-se diretamente a "momento culminante", reforçando a ideia de que o momento é o que está sendo vivido, o que caracteriza o uso pleonástico, ou seja, a repetição do objeto direto com um pronome pessoal átono.
No texto, o uso do objeto direto pleonástico enfatiza a importância do "momento culminante" na vida do narrador. A repetição do objeto através do pronome "o" não apenas clarifica a quem ou ao que se refere, mas também intensifica a expressão da vivência desse momento, que é crucial para o entendimento da experiência intensa que o narrador relata. Esse aspecto é fundamental para a interpretação da narrativa, já que o narrador está refletindo sobre uma experiência que moldou toda a sua vida.
As outras alternativas não apresentam essa construção pleonástica. Por exemplo, nas opções A, B, C e E, não há a presença de um pronome que repete ou esclarece o objeto direto de forma pleonástica. Em suma, a escolha da alternativa D é justificada pela presença clara do objeto direto pleonástico "o" em relação ao objeto direto "este momento culminante", que destaca a relevância do tema no contexto da narrativa.
Institução: UNIFESP
Ano da Prova: 2015
Assuntos: Interpretação Textual
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